Bia Garbato: Fúria alimentar

Bia Garbato: Fúria alimentar
Se, por um lado nos tiram a obrigação de cair da cama e levar o rebento pra escola, por outro, trazem alguns desafios. Nessa época, a fome das crianças não se regula pelo horário das refeições. Ela se torna uma coisa única, constante e crônica. É o tempo todo: “Maaaaãe, tô com fome.” “Mãe, não tem nada pra comer!” Obviamente, pera e mini cenourinhas não se qualificam como algo pra comer.
No terceiro dia de pipoca veio o desabafo: “Mãe, eu não aguento mais comida salgada. Meu paladar é doce.” Ah, tá. Exausta com a missão de atender os desejos do pequeno crítico gastronômico, apelei: comprei bolinhos Ana Maria sabores variados. Peguei mais do de cenoura e chocolate, justificando que era de legume. Caprichei no biscoito waffle – camadas crocantes recheadas de manteiga sabor chocolate, que já vem se esmigalhando no pacote e que, certamente, vai se enfiar entre as almofadas do sofá. Para beber, suquinho 100% maçã da Yakult, me enganando de que maçãs recém-colhidas vão direto da cestinha de palha pra caixinha Tetra Pak.
Cheguei a me perguntar: “Como é que minha mãe fazia?” Lembrei que, nos anos 1980, não pegava mal comprar um pacote enorme com pequenos pacotes de salgadinhos – de isopor sabor queijo, tipo Cheetos. Uma iniciação ao colesterol alto. Mas, motivada pela intuição de que Cebolitos não era feito de cebola, uma vez por semana ela nos servia o “sopão vitaminado”. Seu sabor era uma mistura de couve fresquinha, terra molhada e raspinhas de lápis apontados. Não tínhamos escolha. Impossível discutir com uma mãe determinada a equilibrar a saúde dos filhos. Até pensei em fazer o sopão para meu filho. Liguei pra minha mãe, que, obviamente, não lembrava a receita e achou que o biagarbatosegredo era coentro. Coentro é sacanagem. Com o avanço de quatro décadas, aquela não era a solução. Resignada, resolvi pegar o caminho aparentemente mais trabalhoso. Fiz uma lista de lanchinhos nutritivos e afixei na geladeira. Milho cozido, ovinhos de codorna, banana com mel. E, ainda, estipulei o horário dos lanches: 11h, 15h e 17h. Parece muito, mas, pra minha situação atual, é um paraíso. Sim, tenho que tirar o milho da espiga e colocar num pratinho com manteiga (maldita invenção das barraquinhas da praia). Mas, com isso, fui obrigada a organizar a minha própria alimentação. Percebi que café com amendoim no meio da tarde também não é saudável. Nessa pausa, passamos a conversar mais. Passei a saber qual é o Pokémon mais forte. Rimos, nos divertimos. E comer passou de uma forma de tapar um vazio, para uma forma de preencher barrigas e corações.
Leia mais colunas de Bia Garbato, clicando aqui!
Acesse nosso instagram!
