Helio Contador: "Corrupção, ética e o cérebro humano"

Quem não conhece alguém, principalmente idosos, que tenha caído no conto do cartão clonado? Entenda como funciona o cérebro das pessoas que praticam esse crime
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O conto de cartão de crédito clonado. Quem não conhece alguém, principalmente idosos, que tenha caído nesse conto do cartão clonado? Aquele em que a pessoa, muito educada, liga para a gente se passando pelo gerente do Banco e perguntando se foi feita alguma compra recente num local diferente do habitual. A vítima fala que não foi feita a compra e aí começa a dramatização onde o suposto gerente informa que o cartão foi clonado e que precisa ser retirado junto ao cliente através de um motoboy que, rapidamente, aparece no local. Uma vez retirado o cartão, o “gerente” retorna a ligação confirmando essa retirada e pede a senha de 4 dígitos para finalizar o cancelamento e a emissão de um novo cartão. Esses criminosos, porque não tem outra qualificação melhor para eles, tem um poder de convencimento e persuasão muito grandes e são bem preparados para enganar os outros, abusando da ingenuidade das pessoas, principalmente dos mais idosos.

Como será que o cérebro dessas pessoas funciona em termos de ética e moral e que áreas neurológicas são ativadas quando eles praticam esses crimes? Para tentar explicar esses pontos de uma forma simplificada, vou usar alguns conceitos e pesquisas utilizadas pelo Dr. André Palmini, professor da PUC do Rio Grande do Sul. A Neuroética é um campo de estudos que combina as disciplinas da filosofia e neurociência para o estudo da ética, que busca entender as bases neurais que atuam num comportamento honesto, ético e moral, através do conhecimento e pesquisas das conexões sinápticas. Utiliza exames de neuroimagem e testes neurológicos para mapear as áreas cerebrais que se ativam quando praticamos atos e decisões éticas, morais ou de caráter.

O comportamento humano, em situações que prejudicam deliberadamente outras pessoas, deveria causar constrangimentos e vergonha pública para os que praticam esses atos desonestos. A vontade de tirar vantagem em alguma coisa ativa os circuitos de recompensa e prazer do cérebro humano, trazendo um impacto biológico semelhante ao da adição das drogas no organismo. Isso faz com que o indivíduo corrupto seja cada vez mais dependente de comportamentos corruptos, assim como um adicto se torna, via de regra, cada vez mais escravo das drogas.

Essa explicação é, para mim, uma evidência do porquê, mesmo no meio de um gigantesco processo público com tanta gente (incluindo políticos importantes) sendo presa por corrupção, ainda existam pessoas que continuam a praticar atos contra o patrimônio público ou então abusando da inocência alheia.

A mentira e a desonestidade, na primeira vez em que são praticadas, causam uma certa sensação de perigo e desconforto, porque representa algo que o cérebro identifica como uma ameaça. Se, após esse ato, não houver punição suficiente, a tendência é repetir e se escalar essa desonestidade. Dependendo do ganho, o cérebro calcula as vantagens e desvantagens de se continuar agindo dessa forma, levando o sistema dopaminérgico a impulsionar as pessoas rumo à recompensa.

Vencer o vício da corrupção é uma tarefa trabalhosa, pois significa a constante luta entre a razão e a emoção, sendo essa última liderada pelos nossos instintos primitivos de sobrevivência e reprodução da espécie. A razão, por outro lado, tem que ser moldada pelos valores, crenças, ética e cultura que a experiência de vida nos traz, lutando para integrar e gerenciar a emoção a viver num contexto civilizado e social.

Entendo que a superação dos hábitos da corrupção e desonestidade seja possível quando a dor e os prejuízos consequentes desses atos sejam maiores do que o prazer em executá-los, através das penalidades das leis sociais ou pelo repúdio da sociedade às essas pessoas.

De qualquer forma, fiquem atentos aos golpes da malandragem, que também se atualizam e se modificam com os avanços da tecnologia. Que bom se pudessem usar toda essa inteligência para o bem dos demais!

Um abraço e até o próximo artigo.

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